domingo, 2 de junho de 2013

A Purificação Anual da Sé


Anualmente, na véspera do aniversário de São Paulo, durante a madrugada do dia 24 para 25 de janeiro, ocorre na Praça da Sé o maior evento do Conselho das Nove Tradições Místicas na cidade, a Purificação do Nodo da Sé. Magos de todas as Tradições se reúnem na praça para reafirmarem suas alianças e compromissos com o Conselho na Guerra da Ascensão e, através de suas visões unidas, trabalharem em conjunto na purificação do Nodo mais importante da cidade.

Esse evento é organizado pelo Coro Celestial, os guardiões do Nodo da Sé e a Tradição mais influente na cidade. É um dos raríssimos eventos - e o único que ocorre com periodicidade regular - em que os magos do Coro removem todas as barreiras, travas e proteções que guardam o enorme fluxo de Quintessência do Nodo da Sé e permitem outros magos terem acesso a ele. O evento serve para reforçar não apenas os laços que existem em toda a comunidade de Tradicionalistas em São Paulo, reafirmando o seu espírito de grupo e cooperação, como também a posição do Coro de destaque no Conselho. Esse é, efetivamente, um dos eventos do ano no calendário de quase todo Desperto das redondezas que faça parte de alguma Tradição.

As razões para isso vão além da mera oportunidade de fazer um social com outros colegas - algo que por si seria desprezado por muitos. Não, a principal razão para o comparecimento de muitos é a permissão que os magos do Coro dão a todos os Despertos que participarem do ritual para colherem um pouco da Quintessência do Nodo da Sé para si mesmos. Quintessência "gratuita" é algo bastante raro e valorizado por diversos magos e poucos são os que deixam de aproveitar uma oportunidade como essas para obter Quintessência sem correr riscos ou ficar devendo favores a outros. Assim, o comparecimento ao evento costuma ser bastante grande.

A reunião costuma ter início por volta das dez horas da noite do dia 24. A maioria dos Despertos chega por volta desse horário na praça, para socializarem com outros, inteirarem-se dos assuntos na comunidade tradicionalista de São Paulo, proclamarem suas causas, cobrarem favores, ouvirem algumas apresentações e palestras (sempre há pelo menos umas duas rodas formadas na praça, em que algum membro, normalmente um Mestre, faz alguns discursos curtos e recebe perguntas). Por volta das onze e meia começa o ritual propriamente dito. A primeira parte dele consiste em "destrancar" o Nodo, liberando o fluxo de Quintessência. Os magos da cabala "Os Discípulos de Paulo" (que são os responsáveis pelo Nodo da Sé) normalmente coordenam os demais Despertos presentes nessa parte do ritual, embora essa coordenação seja propositalmente frouxa, para permitir que cada mago consiga operar dentro de suas próprias práticas. Em geral, essa etapa dura meia hora e exatamente a meia noite, o fluxo de Quintessência do Nodo é liberado (e os experientes magos do Coro costumam acertar o momento de "realização" desta etapa com cada vez mais precisão, cravando na meia noite dos relógios). Após o fluxo de Quintessência ser liberado, começa a parte de purificação. Nesta etapa, os Despertos tentam purgar a Ressonância da Quintessência do Nodo, usando suas crenças para torná-la menos negativa e assim espalhar uma vibrações melhores por toda a cidade. É também nessa etapa em que se permite a colheita de Quintessência do Nodo. Em geral, esse Ritual se estende por mais duas horas, embora sejam raros os que fiquem até o final. Após uma hora de ritual, a maioria já se deu por satisfeita, absorveu sua parte de Quintessência e foi para casa.

Será nessa reunião, no dia 24 de janeiro de 2013, que terá início a nossa história. São dez e meia da noite e todos os personagens estão reunidos na Praça da Sé. Alguns deles são mais amigos, outros tiveram apenas um breve contato, mas os cinco se conhecem e possuem uma relação pelo menos cordial entre si.

É uma noite quente de verão e diversos Despertos já estão reunidos na Praça da Sé. Há por volta de quinhentas pessoas ali e a magia pode ser quase sentida no ar - talvez pela presença de um número tão grande de Despertos, talvez pela proximidade de um Nodo tão forte, talvez pelos Arcanos que, dizem os boatos, protegem secretamente essa reunião de qualquer investida da Tecnocracia que queira se aproveitar da oportunidade. Um sacerdote da Igreja Católica em seus trajes de Bispo caminha calmamente entre os presentes, inspecionando tudo e cumprimentando algumas pessoas. Uma pequena roda está formada ao redor de um senhor de origem asiática, já bem idoso, em roupas de monge, discursando para magos mais jovens.

E no ar, a sensação que, de alguma forma, aquela será uma noite memorável...

Temas do Cenário

O nosso cenário de jogo, a nossa versão específica de São Paulo dentro do universo do mundo das Trevas (a que chamamos de São Paulo Místika) foi criada de forma colaborativa entre Narrador e jogadores. Normalmente, o padrão nos jogos de RPG é que o Narrador cuide praticamente sozinho da criação do cenário, mas a nossa proposta de jogo aqui é um pouco diferente e a ideia é que os jogadores tenham uma participação bastante forte no enredo da Crônica, atuando como "Narradores-auxiliares", discutindo as ideias que compõem o jogo e ajudando a criar a trama.

Uma das primeiras formas em que essa voz maior dos jogadores se manifestou foi na criação do cenário em que a Crônica seria ambientada. Conforme eu comentei no post inaugural, a escolha de São Paulo como palco da narrativa foi decidida em conjunto, mas a participação deles foi além disso. Usando o sistema de criação de cenários de Dresden Files, no nosso primeiro encontro de jogo nós começamos a delinear os contornos da nossa cidade.

Este processo de criação de cenário começa com a definição de "Temas" para a cidade. Temas são fatos e ideias a respeito da cidade que aparecem de forma recorrente nas histórias que contamos nela. Eles são os elementos que definem o cenário num nível além da mera geografia e demografia; eles dão tom às histórias e impactam os enredos e tramas que se passam ali.. Os temas que definimos para o nosso jogo são os seguintes:



Espiritualidade Degenerada
São Paulo é uma cidade com uma presença do sobrenatural forte, localizada no coração de grandes Linhas Míticas, porém a pureza da energia que fluia sobre a cidade foi sendo paulatinamente degenerada e maculada pela própria degeneração humana do local, os vícios e crimes ali propagados conspurcando o poder bruto que ali existe. São Paulo é uma cidade sagrada, porém cujo brilho da santidade morre um pouco mais a cada noite. Este tema reflete uma presença forte do mágico, do maravilhoso e do mítico dentro das histórias criadas dentro da cidade, mas ao mesmo tempo dá um tom um pouco melancólico a toda essa magia, uma sensação que as maravilhas do mundo estão fenecendo e que a magia pode estar próxima de encontrar o seu triste e derradeiro fim. Há Amor em São Paulo, há colorido, há magia, mas o Amor está sendo sufocado pela rotina, o colorido está desbotando e a magia corrompida e debilitada.



O Crime Está em Todo Lugar
O Errado é a norma aqui e o crime atinge a todos. Desde o alto escalão, envolvido em corrupção, lavagem de dinheiro e demais crimes de colarinho branco até as favelas, onde o tráfico e a violência prosperam. O crime é o "óleo" que permeia todas as engrenagens da cidade e une todos os segmentos dela: as drogas consumidas no alto escalão são feitas na favela; a arma que o pivete usou para fazer um assalto foi roubada do quartel da polícia; o dinheiro sujo que o templo arrecadou foi lavado na empresa do pai do militante LGBT. Se você não está entre os causadores, está entre as vítimas. Sendo ainda os Despertos personagens dinâmicos e agentes da mudança como são, mais cedo ou mais tarde - e provavelmente cedo - o crime baterá às portas de suas vidas e cobrará seu preço. Como cada personagem reagirá a isso ainda está para ser visto. Valentemente abraçarão ideais platônicos e tentarão purgar a cidade de seus vícios e fazer dela um lugar melhor? Adaptarão-se ao sistema, encaixando-se nas engrenagens, jogando o jogo da melhor forma que puderem?



Os Vinte e Dois Arcanos
Vinte e duas entidades místikas controlam os eventos mais importantes no território sobrenatural da cidade. São eles que garantem que os nodos mais antigos não são invadidos, que determinam as zonas de influência de cada facção e arbitram as maiores disputas do submundo sobrenatural de São Paulo. Seu poder é conhecido, sua autoridade é respeitada e suas naturezas são um mistério. Eles não são envolvidos em questões mundanas ou banais e sua influência normalmente é sutil e reservada para grandes eventos. A última vez que se soube de uma intervenção direta de um Arcano foi durante a década de 90, quando o Arcano da Força precisou intervir para proteger a cidade da invasão de um Dragão invocado por um grupo de Desauridos. Após esse episódio, os dois (na verdade três) únicos outros Arcanos que a maioria dos Despertos e outros seres sobrenaturais têm contato é com O Louco, o mais acessível deles (e o único que inclusive costuma se meter até mesmo em assuntos banais ou que não foi chamado) e As Amantes, o casal de lésbicas que mantém a Love Story, o "território Neutro" da cidade.

Sobre o Tarot no nosso jogo.

Uma das novidades introduzidas no nosso jogo - e que até agora tem funcionado bastante bem - é o uso de um baralho de Tarot como ferramenta para nos auxiliar a escrever as histórias dos personagens, enriquecendo-as e colocando alguns detalhes interessantes nelas. A ideia, embora tenha sido novidade para todos os jogadores, não é exatamente uma invenção minha e foi algo que eu peguei emprestado e adaptei do livreto que acompanha o baralho de Tarot de Mago: A Ascensão.

O propósito do Tarot aqui era duplo. Por um lado, ele ajuda a passar todo o sentimento e aura de misticismo moderno, a por os jogadores no clima de sobrenatural e mágiko do jogo. Por outro, ele serve para adicionar novos detalhes às histórias, ganhar inspiração para os desinspirados e adicionar torções inesperadas nas histórias, enriquecendo os personagens no processo.

O funcionamento da ideia é bastante simples. Cada personagem recebeu inicialmente três cartas do baralho: uma representando a vida dele enquanto Adormecido, uma representando o seu Despertar e uma terceira representando o seu mentor. A partir dessas cartas, lê-se as interpretações possíveis para elas e tentamos introduzir na história algum elemento que tenha a ver com as cartas que foram tiradas. Um exemplo: um dos jogadores tirou uma carta que, dentre os vários significados dela, estava associada a falsas profecias. A partir disso, decidimos que durante a sua infância a família dele foi perseguida por membros de outras religiões.


Inicialmente, a ideia era usar apenas três cartas, como dito acima, mas uma vez que se tenha entendido o funcionamento da proposta, nada impede que se usem as cartas para outros aspectos da história do personagem. Outra coisa bem interessante que aconteceu em nossa sessão é que praticamente todas as cartas que foram tiradas possuíram significados bastante próximos aos conceitos dos personagens em questão. Coincidência ou não, isso deixou todos os jogadores com uma sensação de "destino" nas cartas que tiramos...

Para quem quiser ler um pouco mais sobre o Tarot, eu recomendo o seguinte site:

Além disso, quem quiser brincar de tirar algumas cartas de Tarot, pode usar o seguinte site:
http://www.facade.com/tarot/

Uma coleção de links sobre o clima sobrenatural de São Paulo.

Seguem aqui alguns links que fui reunindo na net que contam um pouco mais sobre a cidade de São Paulo e estimulam a imaginação para conceber uma versão sobrenatural dela:

http://ahduvido.com.br/50-lendas-urbanas

http://www.terra.com.br/esoterico/infograficos/lugares-assombrados/

http://descobrindosaopaulo.blogspot.com.br/2010/08/subterraneos-de-sao-paulo.html

Inauguração do blog São Paulo Místika

Saudações, leitores!

Como, acredito, é de praxe ao iniciar um novo blog, explicarei aqui na postagem inicial qual a proposta dessa página, os propósitos e ferramentas que a fizeram existir.

São Paulo Místika é um projeto que estou desenvolvendo para uma crônica de RPG. Se você não sabe o que é RPG, eu sugiro procurar no Google a respeito do termo, que existem várias e boas explicações por aí sobre o que é este jogo, muito melhores do que qualquer uma que eu estou disposto a dar neste espaço. Todavia, apenas para não deixá-lo sem resposta (o que seria deselegante da minha parte), RPG é em sua essência um jogo de contar histórias. Cada jogador interpreta e define as ações de um dos protagonistas dessa história e um deles, chamado de Narrador, define as ações de todos os demais coadjuvantes e antagonistas. Cada grupo de histórias criadas pelo Narrador e os jogadores recebe o nome de "Crônica". Eu sou o Narrador desta Crônica.

Mesa de RPG - talvez você já tenha visto alguma.

A Crônica de São Paulo Místika está ambientada num cenário de ocultismo moderno que veio do jogo Mago: A Ascensão. Neste jogo, crenças e idéias pode moldar a realidade. Os personagens são Despertos, homens e mulheres que possuem acesa a centelha da magia. Desde de tecnomagos com suas invenções malucas até xamãs com suas invocações de espíritos, há uma enorme gama de personagens possíveis no jogo. Basicamente, se você gosta do fantástico, do milagroso e do mítico, esse jogo vai te cativar.

Todo jogo precisa também de regras e nesse caso, as regras que estamos utilizando em nossa mesa não são as regras originais do jogo de Mago: A Ascensão. Ao invés de usar as regras apresentadas nos livros de Mago (o chamado "sistema Storyteller"), optamos por utilizar uma variante de um sistema de regras chamado FATE. As regras da nossa variante são bem próximas - mas não idênticas - às do jogo Dresden Files, que por sua vez é um jogo também sobre o sobrenatural urbano, similar ao cenário de Mago (também conhecido como Mundo das Trevas).

Quais as razões para essa mistura? Por que não ficar apenas com Mago, cenário e regras, ou alternativamente, não ficar apenas com Dresden Files? Essa é uma pergunta que pode ocorrer, sobretudo àqueles que já conhecem melhor um dos dois jogos.

Mago é um cenário incrível. Eu conheço esse jogo há treze anos e ainda me maravilho com algumas idéias dele. O clima de milagre, de fascínio, de maravilha dele é algo que eu nunca fui capaz de encontrar em qualquer outro cenário - seja de RPG ou não - de misticismo moderno e sobrenatural urbano. Além disso, alguns dos temas subjacentes ao cenário, como como a responsabilidade pelas consequências dos próprios atos, são também bastante particulares ao jogo. Para aqueles que conhecem um pouco melhor a linha de Mago, cabe talvez a pergunta de por que eu ter escolhido usar o Ascensão ao invés do Despertar ou talvez do Cruzada dos Feiticeiros. A razão para isso foi simplesmente uma questão de riqueza do cenário. Embora tanto Mago: O Despertar e Mago: A Cruzada dos Feiticeiros tenham um material muito bom, eu acredito que a linha do Ascensão possui ainda um material mais rico que qualquer um dos outros títulos.

Esse é o feeling incrível de Mago.

Porém, um ponto que sempre me desapontou em Mago, sobretudo no Mago: A Ascensão são as regras dele. O sistema Storyteller, na minha (pouco) humilde opinião, é um sistema fraco e que não se presta a proposta inicial dele, que é apresentar um conjunto de regras flexíveis, simples e dinâmicas que permitam aos jogadores deixá-las em segundo plano e focar-se na história que está sendo narrada. Não entrarei em muitos detalhes aqui de porque tenho essa opinião, pois meu objetivo não é convencer ninguém dela e tampouco atacar o sistema, mas enfim, o importante é que eu sempre fui insatisfeito com as regras do jogo e nunca achei que elas conseguiam traduzir de forma adequada conceitos interessantes e importantes do cenário.

Durante muitos anos eu tive essa opinião e tentei diversas vezes adaptar as regras de Mago para outros sistemas e fazer por conta própria os meus remendos nas regras originais, sempre sem muito sucesso. Um belo dia, descobri o sistema de FATE e senti que havia encontrado a solução para um enigma que há tempos me desafiava. Foi algo quase instantâneo, no mesmo momento que eu ia lendo as regras do sistema pela primeira vez eu ia já imaginando como elas ficariam bem com Mago e como eu poderia usá-las para expressar certas idéias no jogo que eram deixadas meio de lado pelo sistema original. Isso porque, a meu ver, as regras de FATE são aquilo que o sistema Storyteller sempre almejou e nunca conseguiu ter, regras focadas na narrativa, que por um lado são simples e por outro auxiliam e exploram o drama e dramatismo de cada história. Elas eram o que eu precisava para o meu jogo. Após passar alguns meses trabalhando numa adaptação das regras de Mago para o sistema de FATE, eu tinha em mãos um material suficiente para começar a jogar.

Por fim, a escolha de São Paulo como "base" para a crônica foi uma decisão coletiva entre eu e os demais jogadores. Embora eu não possa falar por eles (se bem que talvez eles possam comentar aqui explicando), as razões que me levaram a adotar São Paulo como localidade da Crônica foram três: a) São Paulo é a cidade onde eu e todos os jogadores estamos morando atualmente, então facilita bastante para nós criarmos referências e lugares nesta cidade; b) é uma grande metrópole, o que ressoa bem com a atmosfera do cenário do Mundo das Trevas, do punk gótico e sujo, além de ser uma cidade em que tudo acontece, conectada ao restante do Brasil e do mundo, fácil de encaixar várias histórias e por fim; c) é uma cidade com uma história antiga, prato cheio para o sobrenatural.

São Paulo Místika

Tendo explicado já a proposta do nosso jogo, esta página foi criada para postarmos material referente a ele, desde imagens e músicas para inspirar os jogadores até regras específicas e resumos das nossas sessões de jogo. Assim, esperem ver aqui material sobre Mago, FATE e São Paulo, bem como resumos de uma história ambientada neste cenário.



E é isso, espero que curtam.

Marquês de Salles.